As ruas não cabem em um orçamento – nem as perguntas

As mensagens dos protestos estão cada vez mais díspares. Parece que os movimentos estão se diferenciando e, aparentemente, trazendo à tona bandeiras distintas.  Mas nem tudo que se ouve nas ruas cabe nos orçamentos federal, estaduais e municipais. Os orçamentos de cada esfera de governo têm limites e já são bastante engessados pela quantidade de recursos carimbados para gastos específicos – como saúde e educação – e para pagar o custo da máquina administrativa – salários, pensões, etc. A falta de coordenação entre esferas de governo não contribui – com ou sem “plano nacional”. Portanto, a margem de manobra é baixa para novos gastos.

Para se promover uma mudança concreta na alocação, nas prioridades e na eficiência dos gastos públicos será preciso ir mais adiante: até que ponto o Brasil terá que se reformar? Iniciaremos pela reforma política desta vez? Por outro lado, que tamanho de estado estamos falando: maior (mais impostos e mais gastos), menor (menos impostos e menos gastos) ou o mesmo (mesmo nível de impostos, mas realocação de gastos)?

Quem ouviu com atenção o clamor popular fica um pouco confuso. Como subsidiar mais tarifas de transportes públicos sem aumentar impostos? Como garantir investimentos em qualidade com uma tarifa mais baixa? Até mesmo renegociando contratos com empresas fornecedoras, há um limite. Estatizar empresas de transporte público é a solução? O SUS tem cobertura universal e compromete mais de 10% do orçamento da União. Para melhorar a qualidade do sistema público de saúde, o que faremos? Aumentaremos o volume de recursos, a cobertura universal será abolida ou buscará melhorar eficiência de uma vez por todas?  Se a última opção for vencedora, que reformas na gestão pública serão necessárias? Quase 15% do orçamento federal e 20-30% dos orçamentos subnacionais são gastos em educação. É problema de dinheiro? Por que não está funcionando?

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Os questionamentos são muitos, e ainda estão no ar. Não tardará para que o calor das discussões políticas migre para as discussões técnicas. Até porque, primeiro é preciso definir que rumo político os brasileiros querem para o país.

Antes que lhes veem a mente, lembro que corrupção também não funciona como vala comum para todos os males do país. Mesmo estando imiscuída em todas as perguntas acima, de uma forma ou de outra, para combatê-la é preciso separá-la. Soluções que melhorem a própria gestão de bens públicos por meio das instituições responsáveis por tais políticas ou pelo seu monitoramento e auditoria contribuem para o combate a corrupção. Ademais, é incompleta a discussão de soluções para a luta contra corrupção sem discutir financiamento de campanha, um dos temas da reforma política.

A pergunta que resta – e que foi negada pelos Presidentes Lula e Dilma desde 2002 – é: reiniciaremos uma agenda de reformas de Estado? A nova pergunta é: para que lado vamos?




2 respostas para “As ruas não cabem em um orçamento – nem as perguntas”.

  1. Lúcido, como sempre. Com certeza sobrarão mais impostos e será aplicada a política “Robin Hood”, como foi dito ontem pelo prefeito de Porto Alegre. “E por isso a gente vai propor entre outras questões a criação da Cide sobre gasolina e álcool, para que quem usa o automóvel ajude a financiar quem usa o transporte coletivo. Com isso, nós estaremos qualificando o transporte coletivo e baixando o preço da passagem. É o que eu chamo da política Robin Hood”.

  2. Obrigado, Cidoca. Em princípio, não sou contra a esse tipo de taxação. Agora, e reformas, sobretudo a tributária? Quem vai encarar a máquina?


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