Capão do Leão

Quando minha mãe ia embora,
o meu choro explodia — vinha
de uma essência incontrolável.

Depois, tudo me distraia:
o espinho do cacto que percorria a carne,
a casinha do joão-de-barro,
a laranja-de-umbigo,
a bosta das vacas,
os chapéus-de-cobra,
as abelhas fazendo mel,
o cemitério,
a sanga,
o ônibus a caminho de Jaguarão,
as tardes mornas em que eu pulava a janela
para furar os bolos de Maria Beiró.

Eu corria atrás de seu Belinho, gritando,
implorando pra que não matasse o porco:
— Ele é meu amigo!
Mas seu Belinho metia a faca:
o porco gritava me dizendo adeus.

Às vezes, a chuva me impedia de sair
ou então só quando a geada derretesse.
No alto do cerro morava uma velha…
Negra Rosa botava a chaleira para o mate
Vovó batia as claras para o merengue
Tia Mimosa conversava com o rádio de pilha
O gaúcho passava a cavalo.

À noite, na saleta do casarão,
Eu ouvia a voz da minha mãe:
vinha como do balde atirado à cacimba.
O lampião iluminava os retratos na parede.
Homens e mulheres de olhares antigos,
Todos mortos!

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