La mano dell’artista è anche vento

Cecília Meireles
Cecília Meireles (1901-1964)
(Fonte immagine: Museu de Arte Murilo Mendes)

Cecília Meireles

Antologia poetica

Não busques para lá.
O que é, és tu.
Está em ti.
Em tudo.
A gota esteve na nuvem.
Na seiva.
No sangue.
Na terra.
E no rio que se abriu no mar.
E no mar que se coalhou em mundo.
Tu tiveste um destino assim.
Faze-te à imagem do mar.
Dá-te à sede das praias.
Dá-te à boca azul do céu.
Mas foge de novo à terra.
Mas não toque nas estrelas.
Volve de novo a ti.
Retoma-te.

      Non cercare là.
      Ciò che è, sei tu.
      Sta in te.
      In tutto.
      La goccia è stata nella nuvola.
      Nella linfa.
      Nel sangue.
      Nella terra.
      E nel fiume che si è aperto nel mare.
      E nel mare che si è coagulato in mondo.
      Tu hai avuto un destino così.
      Fatti a immagine del mare.
      Datti alla sete delle spiagge.
      Datti alla bocca azzurra del cielo.
      Ma fuggi di nuovo a terra.
      Ma non toccare le stelle.
      Torna di nuovo a te.
      Riprenditi.

*

DIÁLOGO

Minhas palavras são a metade de um diálogo obscuro
continuando através de séculos impossíveis.
Agora compreendo o sentido e a ressonância
que também trazes de tão longe em tua voz.
Nossas perguntas e respostas se reconhecem
como os olhos dentro dos espelhos. Olhos que choraram.
Conversamos dos dois extremos da noite,
como de praias opostas. Mas com uma voz que não se importa…
E um mar de estrelas se balança entre o meu pensamento e o teu.
Mas um mar sem viagens.

      DIALOGO

      Le mie parole sono la metà di un dialogo oscuro
      che continua attraverso secoli impossibili.
      Adesso comprendo il senso e la risonanza
      che pure porti da tanto lontano nella tua voce.
      Le nostre domande e risposte si riconoscono
      come gli occhi dentro agli specchi. Occhi che hanno pianto.
      Conversiamo dai due estremi della notte,
      come da spiagge opposte. Ma con una voce che non si importa…
      E un mare di stelle oscilla tra il mio pensiero e il tuo.
      Ma un mare senza viaggi.

*

Os remos batem nas águas:
têm de ferir, para andar.
As águas vão consentendo,
esse é o destino do mar.

      I remi battono le acque:
      devono ferire per andare.
      Le acque vanno acconsentendo,
      questo è il destino del mare.

*

Quero una solidão, quero um silêncio,
uma noite de abismo e a alma inconsútil,
para esquecer que vivo, libertar-me
das paredes, de tudo que aprisiona;
atravessar demoras, vencer tempos
pululantes de enredos e tropeços,
quebrar limites, extinguir murmúrios,
deixar cair as frívolas colunas
de alegorias vagamente erguidas.
Ser tua sombra, tua sombra, apenas,
e estar vendo e sonhando à tua sombra
a existência do amor ressuscitada.
Falar contigo pelo deserto.

      Voglio una solitudine, voglio un silenzio,
      una notte di abisso e l’anima inconsutile,
      per dimenticarmi che vivo, liberarmi
      dalle pareti, da tutto ciò che imprigiona;
      attraversare gli indugi, vincere i tempi
      pullulanti di intrecci e ostacoli,
      infrangere limiti, estinguere mormorii,
      lasciar cadere le frivole colonne
      di allegorie vagamente erette.
      Essere la tua ombra, la tua ombra, soltanto,
      e star vedendo e sognando alla tua ombra
      l’esistenza dell’amore risuscitata.
      Parlare con te attraverso il deserto.

*

Para pensar em ti todas as horas fogem:
o tempo humano expira em lágrima e cegueira.
Tudo são praias onde o mar afoga o amor.
Quero a insônia, a vigília, uma clarividência
deste instante que habito – ai, meu domínio triste!,
ilha onde eu mesma nada sei fazer por mim.
Vejo a flor; vejo no ar a mensagem das nuvens
– e na minha memória és imortalidade –
vejo as datas, escuto o proprio coração.
E depois o silêncio. E teus olhos abertos
nos meus fechados. E esta ausência em minha boca:
pois bem sei que falar è o mesmo que morrer:
Da vida à Vida, suspensas fugas.

      Per pensare a te tutte le ore fuggono:
      il tempo umano spira in lacrima e cecità.
      Tutto è spiagge dove il mare affoga l’amore.
      Voglio l’insonnia, la vigilia, una chiaroveggenza
      di questo istante che abito – ah, mio dominio triste!,
      isola dove io stessa non so fare nulla per me.
      Vedo il fiore, vedo nell’aria il messaggio delle nuvole
      – e nella mia memoria sei immortalità –
      vedo le date, ascolto il mio stesso cuore.
      E dopo il silenzio. E i tuoi occhi aperti
      nei miei chiusi. E questa assenza sulla mia bocca:
      poiché so bene che parlare è uguale a morire.
      Dalla vita alla Vita, fughe sospese.

*

De longe te hei de amar
– da tranqüila distância
– em que o amor é saudade
– e o desejo, constância.
Do divino lugar
onde o bem da existência
é ser eternidade
e parecer ausência.
Quem precisa explicar
o momento e a fragrância
da Rosa, que persuade
sem nemhuma arrogância?
E, no fundo do mar,
a Estrela, sem violência,
compre a sua verdade,
alheia à transparência.

      Da lontano ti devo amare
      dalla tranquilla distanza
      in cui l’amore è saudade
      e il desiderio, costanza.
      Dal luogo divino
      dove il bene dell’esistenza
      è essere eternità
      e sembrare assenza.
      Chi ha bisogno di spiegare
      il momento e la fragranza
      della Rosa, che persuade
      senza nessuna arroganza?
      E, nel fondo del mare,
      la Stella, senza violenza,
      compie la sua verità,
      estranea alla trasparenza.

Tratto da Sguardo Mobile
Traduzione di Alice Micheli

 

Cecilia Meireles

 

MOTIVO

Eu canto porque o instante esiste
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
– não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
– mais nada.

      Motivo

      Canto perché l’istante esiste
      e la mia vita è completa.
      Non sono allegro né triste:
      sono un poeta.

      Fratello delle cose fuggitive,
      non provo piacere né afflizione.
      Attraverso notti e giorni
      nel vento.

      Se demolisco o edifico,
      se sono o mi annullo,
      non so, non so. Non so se rimango
      o passo.

      So che canto. E il canto è tutto.
      Ha sangue eterno l’ala ritmata.
      E un giorno so che rimarrò muto:
      – più niente.

*

CANÇÃO

Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
– depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar.

Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre dos meus dedos
colore as areias desertas.

O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio…

Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.

Depois, tudo estará perfeito:
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas.

      Canzone

      Misi il mio sogno in un’imbarcazione
      e l’imbarcazione in mare;
      – dopo, separai il mare con le mani,
      per far naufragare il mio sogno.

      Le mie mani ancora sono bagnate
      del blu delle onde dischiuse,
      e che il colore che scorre dalle mie dita
      colori le sabbie deserte.

      Il vento sta arrivando da lontano,
      la notte si curva per il freddo;
      sotto l’acqua va morendo
      il mio sogno, dentro un’imbarcazione…

      Piangerò quanto sarà necessario
      per far ingrossare il mare,
      e arrivare in fondo la mia imbarcazione
      e il mio sogno far sparire.

      Dopo, tutto sarà perfetto:
      spiaggia rasa, acque ordinate,
      i miei occhi aridi come roccia
      e le mie mani infrante.

*

NADADOR

O que me encanta é a linha alada
das tuas espáduas, e a curva
que descreves, pássaro da água!

é a tua fina, ágil cintura,
e esse adeus da tua garganta
para cemitérios de espuma!

é a despedida, que me encanta,
quando te desprendes ao vento,
fiel á queda, rápida e branda.

E apenas por estar prevendo,
longe, na eternidade da água,
sobreviver teu movimento…

      Nuotatore

      Ciò che mi incanta è la linea alata
      delle tue spalle, e l’arco
      che descrivi, uccello acquatico!

      È la tua sottile, agile vita,
      e questo addio della tua gola
      a cimiteri di spuma!

      È la partenza, che m’incanta,
      quando ti libri nel vento,
      fedele alla caduta, rapida e dolce.

      E appena per star prevedendo,
      lontano, nell’eternità dell’acqua,
      il sopravvivere del tuo atto…

*

INSTRUMENTO

A cana agreste ou a harpa de ouro
permitem que alguém as acorde
com brando pulso ou leve sopro.

Têm memória de águas e vento
e – além dos mundos desvariados –
do silêncio, o etéreo silêncio!

Seus poderes de eternidade
tornam imenso e inesquecível
o som mais transitório e suave.

Chega-te concentrado e cauto,
que o universo inteiro te escuta!
Frase inútil, suspiro falso

vibram tão poderosamente
que a mão pára, o lábio umedece,
com medo do seu próprio engano.

E o eco sem perdões o repete
para um ouvinte sobre-humano.

      Strumento

      Il flauto agreste e l’arpa d’oro
      lasciano che qualcuno li accordi
      con blando polso e lieve soffio.

      Hanno memoria di acqua e vento
      e – oltre ai mondi deliranti –
      del silenzio, o etereo silenzio!

      I loro poteri di eternità
      fanno immenso e indimenticabile
      il suono più transitorio e soave.

      Avvicinati concentrato e cauto,
      che tutto l’universo ti ascolta!
      Frase inutile, sospiro falso

      vibrano così intensamente
      che la mano si arresta, il labbro si inumidisce,
      per timore del loro stesso inganno.

      E l’eco senza perdoni lo ripete
      per un udente sovrumano.

*

CHUVA NA MONTANHA

Como caíram tantas águas,
nublou-se o horizonte,
nublou-se a floresta,
nublou-se o vale.

E as plantas moveram-se azuis
dentro da onda que se toldava.

Tudo se transformou em cristal fosco:
as jaqueiras cansadas de frutos,
as palmeiras de leque aberto,
e as mangueiras com suas frondes
de arredondadas nuvens negras superpostas.

O arco-íris saltou como serpente multicolor
nessa piscina de desenhos delicados.

      Pioggia in montagna

      Cadde tanta acqua,
      si rannuvolò l’orizzonte,
      si rannuvolò la foresta,
      si rannuvolò la valle.

      E le piante si mossero blu
      nell’onda che si avvolgeva.

      Tutto si trasformò in cristallo fosco:
      le jaqueiras stanche di frutti,
      le palme dai ventagli aperti,
      e gli alberi di mango con le loro fronde
      di arrotondate nuvole nere sovrapposte.

      L’arcobaleno guizzò come un serpente variopinto
      in questa piscina di disegni delicati.

*

ESTÁTUA

Jardim da tarde divina,
por onde íamos passeando
saudade e melancolia.

Toda a gente me falava.
E nasceu minha alegria
do que não me disse nada.

O azul acabava-se, e era
céu, toda a sua cabeça,
poderosamente bela.

Nos seus olhos sem pupilas
meus próprios versos estavam
como memórias escritas.

E na curva de seu lábio,
o ar, em música transido,
perguntava por seu hálito.

Ah, como a tarde divina
foi velando suas flores,
água, areia, relva fria…

Nítida, redonda lua
prolungou seu corpo imóvel
numa perfeição mais pura.

Fez parecer que sorria
seu rosto para meu rosto:
divinidade quase sem vida.

Minha cegueira em seus olhos,
minha voz entre seus lábios,
e minha dor em seus modos.

Minha forma no seu plinto,
livre de assuntos humanos.
De longe. Sorrindo.

      Statua

      Giardino della sera divina,
      dove andavamo passeggiando
      nostalgia e malinconia.

      Tutti mi parlavano.
      E nacque la mia felicità
      da chi nulla mi disse.

      L’azzurro finiva, ed era
      cielo, tutto il suo capo,
      prepotentemente bello.

      Nei suoi occhi senza pupille
      i miei stessi versi stavano
      come memorie scritte.

      E nella curva del suo labbro,
      l’aria, passata in musica,
      interrogava con il suo respiro.

      Ah, come la sera divina
      andò velando i suoi fiori,
      acqua, sabbia, freddo prato…

      Nitida, circonfusa luna
      protese il suo corpo immobile
      in una perfezione più pura.

      Fece sembrare che sorrideva
      il suo volto verso il mio:
      divinità quasi senza vita.

      La mia cecità nei suoi occhi,
      la mia voce fra le sue labbra,
      e il mio dolore nella sua espressione.

      La mia forma sul suo piedistallo,
      libera da compromessi umani.
      Da lontano. Sorridendo.

*

A CIDADE SECA

A estrada – pó de açafrão que o vento desmancha.
E quem passa?

O esqueleto visível do poço com suas escadas antigas.
E quem chega?

Pelos palácios vazios, paredes de nácar, de espelhos baços.
E quem entra?

Chuva nenhuma, jamais. Os rios de outrora – vales de poeira.
E quem olha?

Ainda rósea, e crespa de inscrições, de arcos, pórticos, varandas,
a cidade admirável è um cravo seco na mão do sol reclinado.

Do sol que ainda a beija, antes de morrer, também.

      Città arsa

      La strada – polvere di zafferano che il vento disperde.
      E chi passa?

      Lo scheletro visibile del pozzo con le sue antiche scale.
      E chi arriva?

      Nei palazzi vuoti, pareti di madreperla, di specchi appannati.
      E chi entra?

      Pioggia nessuna, mai. I fiumi di un tempo – valli di polvere.
      E chi guarda?

      Ancora rosata, e ruvida di iscrizioni, di archi, portici, verande,
      la mirabile città è un garofano secco nelle mani del sole al tramonto.

      Del sole che ancora la bacia, prima di morire, pure.

*

REINVENÇÃO

A vida só è possível
reiventada.

Anda o sol pelas campinas
e passeia a mão dourada
pelas águas, pelas folhas…
Ah! tudo bolhas
que vêm de fundas piscinas
de ilusionismo… – mais nada.

Mas a vida, a vida, a vida,
a vida só é possível
reinventada.

Vem a lua, vem, retira
as algemas dos meus braços.
Projeto-me por espaços
cheios da tua Figura.
Tudo mentira! Mentira
da lua, na noite escura.

Não te encontro, não te alcanço…
Só – no tempo equilibrada,
desprendo-me do balanço
que além do tempo me leva.
Só – na treva,
fico: recebida e dada.

Porque a vida, a vida,
a vida só é possível
reinventada.

      Reinventare

      La vita solo è possibile
      reinventata.

      Va il sole per le pianure
      e passeggia la mano dorata
      nelle acque, nelle foglie…
      Ah! tutto bollicine
      che vengono da profonde piscine
      di illusionismo… – niente più.

      Ma la vita, la vita, la vita,
      la vita solo è possibile
      reinventata.

      Viene la luna, viene, toglie
      le catene dalle mie braccia.
      Mi lancio in spazi
      pieni della tua Figura.
      Tutta menzogna! Menzogna
      della luna, nella notte buia.

      Non ti trovo, non ti raggiungo…
      Sola – nel tempo equilibrata,
      mi libero dell’oscillare
      che al di là del tempo mi porta.
      Sola – nelle tenebre,
      rimango: ricevuta e data.

      Perché la vita, la vita,
      la vita solo è possibile
      reinventata.

*

PINTURA DE VENEZA

E o Canal a oscilar as longas águas plúmbeas,
e a voz do gondoleiro a ecoar em muros úmidos,
a abrir passagem nas estreitas ruas líquidas…

Ouro, negro, escarlate, essas cores da gôndola,
e seu fino perfil, tragicamente lírico:
– harpa, sereia, cimitarra – transformando-se…

Este fundo de mar, estes mortos crustáceos,
este limo, esta sombra, e esta ramagem límpida,
nos remos – franja vã de esmeraldas e pérolas.

Ah! o tempo concentrado entre as pontes e a névoa,
e as escadas à chuva e à solidão levando-nos.
E os olhos cheios de mosaicos e de lágrimas…

Labirintos de calcedônias e crepúscolos.
Guardai meu sonho que deixei sobre relíquias,
na asa dos pombos, e na vasta, insigne púrpura

dos redodendros, fugitivos como pássaros…

      Quadro veneziano

      E il Canale a oscillare le lunghe acque plumbee,
      e la voce del gondoliere a echeggiare in muri umidi,
      ad aprire passaggi nelle strette vie liquide…

      Oro, nero, scarlatto, questi colori della gondola,
      e il suo snello profilo, tragicamente lirico:
      – arpa, sirena, scimitarra – trasformandosi…

      Questo fondo di mare, questi crostacei morti,
      questo limo, questa ombra, e questo limpido arabesco,
      nei remi – frangia vana di smeraldi e perle.

      Ah! il tempo concentrato fra i ponti e la nuvola,
      e le scale alla pioggia e alla solitudine portandoci.
      E gli occhi pieni di mosaici e di lacrime…

      Labirinti di calcedonio e crepuscoli.
      Custodii il mio sogno che lasciai su reliquie,
      sull’ala dei colombi, e sull’ampia, insigne porpora

      dei rododendri, fuggitivi come passeri…

*

PEDRAS DE FLORENÇA

Ó pedras de Florença,
onde os dias são mansos
como pombos dormentes,
e as vozes se desmancham
com doce antiguidade…

Viva é sempre a memória
dos poetas, entre estátuas,
e na sombra das pontes,
há uma cinza de encontros…

Ó pedras de Florença
que o tempo eternamente
contorna, alisa, brune,
torres, logge, fachadas…

E não falo das lajes
ondes os vivos resvalam,
nem dos muros perfeitos
onde os perfis despertam
a sua eternidade.

Falo das pedras simples
dos frios cemitérios,
esses mormóreos livros
de tão polídas páginas,
dessas letras de adeuses,
de eloqüente saudade,
tão comovida e terna
gentileza das lágrimas.

Ó pedras de Florença,
mãos de lírio pousadas
no horizonte do mundo,
junto à praia das almas…

      Pietre di Firenze

      O pietre di Firenze,
      dove i giorni sono miti
      come colombi dormienti,
      e le voci si dissolvono
      dolcemente arcaiche…

      Viva è sempre la memoria
      dei poeti, fra statue,
      e nell’ombra dei ponti,
      vi è cenere di incontri…

      O pietre di Firenze
      che il tempo eternamente
      avvolge, leviga, consuma,
      torri, logge, facciate…

      E non parlo delle pietre
      dove i vivi passano veloci,
      né dei muri perfetti
      dove i profili risvegliano
      la loro eternità.

      Parlo delle semplici pietre
      dei freddi cimiteri,
      quei marmorei libri
      dalle pagine così levigate,

      di quelle lettere di addio,
      di eloquente nostalgia,
      tanto commossa e tenera
      gentilezza delle lacrime.

      O pietre di Firenze,
      mani di giglio posate
      sull’orizzonte del mondo,
      vicino alla spiaggia delle anime…

Tratto da Smerilliana
Traduzione di Mirella Abriani

 

C. Meireles, Viagem

 

Por que me falas nesse idioma?

Por que me falas nesse idioma? perguntei-lhe, sonhando.
Em qualquer língua se entende essa palavra.
Sem qualquer língua.
O sangue sabe-o.
Uma inteligência esparsa aprende
esse convite inadiável.
Búzios somos, moendo a vida
inteira essa música incessante.
Morte, morte.
Levamos toda a vida morrendo em surdina.
No trabalho, no amor, acordados, em sonho.
A vida é a vigilância da morte,
até que o seu fogo veemente nos consuma
sem a consumir.

      Perchè mi parli in quella lingua?

      Perché mi parli in quella lingua? gli chiesi,
      sognando.
      In qualsiasi lingua si capisce quella parola.
      Senza alcuna lingua.
      Il sangue lo sa.
      Un’intelligenza dispersa apprende
      Questo invito improrogabile.
      Buccine siamo, consumando la vita
      intera questa musica incessante.
      Morte, morte.
      Passiamo tutta la vita morendo in sordina.
      Nel lavoro, nell’amore, svegli, in sogno.
      La vita è vigilanza della morte,
      fino a che il suo fuoco veemente ci consuma
      senza consumare.

*

Chovem duas chuvas

Chovem duas chuvas:
de água e de jasmins
por estes jardins
de flores e de nuvens.

Sobem dois perfumes
por estes jardins:
de terra e jasmins,
de flores e chuvas.

E os jasmins são chuvas
e as chuvas, jasmins,
por estes jardins
de perfume e nuvens

      Piovono due piogge

      Piovono due piogge
      d’acqua e di gelsomini
      per questi giardini
      di fiori e di nuvole.

      Esalano due profumi
      Per questi giardini:
      di terra e di gelsomini,
      di fiori e piogge.

      E i gelsomini sono piogge
      e le piogge, gelsomini,
      per questi giardini
      di profumo e nuvole.

*

Namorados

No degrau do inverno turno,
sentaram-se os namorados.
Vai crescendo entre os seus ombros
denso bosque de impossíveis,
com muitos ramos escuros.

Um denso bosque de espinhos
vai crescendo entre os seus lábios.
Pálidas palavras secas,
folhagem de despedidas,
sombra de confusa angústia
na curva jovem da boca,
no doce lugar dos beijos.
Tão perdidos, tão sozinhos
por interiores caminhos!

Diante deles, as estátuas,
eternamente enlaçadas,
gloriosamente desnudas,
profundamente amorosas,
com brilhos de primavera
no etéreo gesto de mármore…
(Festivos corpos de pedra!)

Nos namorados humanos,
o corpo é lento e pesado,
longa rede a escorrer lágrimas
nas vastas areias da alma…

      Amanti

      Sul gradino dell’inverno a turno,
      si sederono gli amanti.
      Stai crescendo tra le loro spalle
      denso bosco di impossibili,
      con molti rami scuri.

      Un denso bosco di spine
      stai crescendo tra le loro labbra
      Pallide parole secche,
      foglie di addii,
      ombra di confusa angustia
      nella curva giovane della bocca,
      nel dolce luogo dei baci.
      Così persi, così soli
      per intimi sentieri!

      Innanzi a loro, le statue,
      eternamente avviluppate,
      gloriosamente nude,
      profondamente soavi,
      con luminosità di primavera
      nell’eterea aspetto marmoreo…
      (Festivi corpi di pietra!)

      Noi amanti umani,
      il corpo è lento e pesante,
      lunga rete su cui scorrere le lacrime
      nelle vaste sabbie dell’anima.

Tratto da Sagarana
Traduzione di Irma Caputo

 

Cecilia Meireles

 

RETRATO EM LUAR

Meus olhos ficam neste parque,
minhas mãos no musgo dos muros,
para o que um dia vier buscar-me,
entre pensamentos futuros.

Não quero pronunciar teu nome,
que a voz é o apelido do vento,
e os graus da esfera me consomem
toda, no mais simples momento.

São mais duráveis a hera, as malvas
que a minha face deste instante.
Mas posso deixá-la em palavras,
gravada num tempo constante.

Nunca tive os olhos tão claros
e o sorriso em tanta loucura.
Sinto-me toda igual às árvores:
solitária, perfeita e pura.

Aqui estão meus olhos nas flores,
meus braços ao longo dos ramos:
e, no vago rumor das fontes,
uma voz de amor que sonhamos.

      RITRATTO AL CHIAR DI LUNA

      Lascio i miei occhi in questo parco
      le mani nel muschio dei muri,
      per quegli che un giorno a cercarmi
      verrà, tra pensieri futuri.

      Non voglio chiarmarti per nome:
      parrebbe il sibilo del vento;
      brucio tra i gradi della sfera
      turra, nel símplice momento.

      Durano più l´edera, l´erba
      che il viso mio di quest´instante.
      Ma psso fissarlo in parole,
      scolpirlo in un tempo costante.

      Mai gli occhi ho avuti tanto chiari
      e folle il riso, come l´aria…
      mi sento tutta uguale agli aberi:
      perfetta, pura e solitaria.

      Qui l´occhio mio vede dal fiore,
      qui il braccio mio teso à nel ramo,
      que voci d´acque vaghe echeggiano
      quella d´amore che sognamo.

Traduzione di Anton Angelo Chiocchio

*

Mulher ao espelho

Hoje que seja esta ou aquela,
pouco me importa.
Quero apenas parecer bela,
pois, seja qual for, estou morta.

Já fui loura, já fui morena,
já fui Margarida e Beatriz.
Já fui Maria e Madalena.
Só não pude ser como quis.

Que mal faz, esta cor fingida
do meu cabelo, e do meu rosto,
se tudo é tinta: o mundo, a vida,
o contentamento, o desgosto?

Por fora, serei como queira
a moda, que me vai matando.
Que me levem pele e caveira
ao nada, não me importa quando.

Mas quem viu, tão dilacerados,
olhos, braços e sonhos seus
e morreu pelos seus pecados,
falará com Deus.

Falará, coberta de luzes,
do alto penteado ao rubro artelho.
Porque uns expiram sobre cruzes,
outros, buscando-se no espelho.

      Donna allo specchio

      Oggi, che io sia questa o quella,
      poco m’importa.
      Voglio solo apparire bella,
      poiché, sarà come sarà, sono morta.

      Già fui bionda, già fui bruna,
      già fui Margherita e Beatrice.
      Già fui Maria e Maddalena.
      Solo non potei essere come volevo.

      Che male fa questo colore finto
      dei miei capelli, e del mio viso,
      se tutto è tinta: il mondo, la vita,
      la gioia, il dolore?

      Di fuori sarò come pare
      alla moda, che mi sta annientando.
      Che se ne vadano pelle e viso sciupato
      al nulla, non m’importa quando.

      Ma colei che vide, cosi decadenti
      occhi, braccia e i sogni suoi,
      e morì per i suoi peccati,
      parlerà con Dio.

      Parlerà, coperta di luci,
      dall’alto della pettinatura alla rubra caviglia.
      Perché alcuni spirano sopra croci,
      altri, cercandosi nello specchio.

*

Vigilância

A estrela que nasceu trouxe um presságio triste:
inclinou-se o meu rosto e chorou minha fronte:
que é dos barcos do meu horizonte?

Se eu dormir, aonde irão esses errantes barcos,
dentro dos quais o destino carrega
almas de angústia demorada e cega?

E como adormecer nesta Ilha em sobressalto,
se o perigo do mar no meu sangue se agita,
e eu sou, por quem navega, a eternamente aflita?

E que deus me dará força tão poderosa
para assim resistir todas a vida desperta
e com os deuses conter a tempestade certa?

A estrela que nasceu tinha tanta beleza
que voluntariamente a elegeu minha sorte.
Mas a beleza é o outro perfil do sofrimento,
e só merece a vida o que é senhor da morte.

      Vigilanza

      La stella nascente portò un triste presagio:
      si inclinò il mio capo e pianse Ia mia fronte:
      che ne è delle barche del mio orizzonte?

      Se io dormo, dove andranno queste barche erranti,
      dentro le quali il destino trasporta
      anime di angoscia indugiante e cieca?

      E come addormentarsi in quest’Isola in soprassalto,
      se il pericolo del mare nel mio sangue si agita,
      e io sono, per chi naviga, l’eternamente afflitta?

      Forse un dio mi darà forza tanto potente
      per cosi resistere tutta la vita desta
      e con gli dei contenere la sicura tempesta?

      La stella nascente aveva tale bellezza
      che per mia volontà la elessi mia sorte.
      Ma la bellezza è l’altro profilo della sofferenza,
      e solo merita la vita chi è padrone della morte.

Traduzione di Mirella Abriani

*

O QUE ME DISSE O MORTO DE POMPÉIA (XVII)

Levanta-me da cinza em que me encontro,
põe nos meus olhos o seu lume antigo!
Desdobra-me na boca a língua imóvel,
ergue os meus passos, leva-me contigo!
Deixa a morte somente com a minha alma,
para haver seu reflexo no que digo.

Andarei pela terra novamente,
— forma efémera já desencantada —
recordando a tristeza que sabia,
provando de outro modo a dor passada,
ensinando a sentir o amor que morre,
e a amar todas as máscaras do nada.

E a estar, ao mesmo tempo, longe e perto,
e a ser múltiplo, unânime e indiviso,
porque estive acordado em plena morte,
e sei tudo o que existe e o que é preciso.
Levanta-me da cinza em que me encontro,
para explicar-te o Inferno e o Paraíso!

Desdobra-me na boca a língua imóvel,
que os mortos sabem mais do que os Profetas.
Faze-me andar de novo, isento e livre,
entre as formas dos vivos incompletas.
Dize-me apenas se há quem possa ouvir-me!
Senão, deixa-me estar nas cinzas quietas.

      QUEL CHE MI DISSE IL MORTO DI POMPEI (XVII)

      Alzami dalla cenere in cui giaccio,
      rendi ai miei occhi il loro lume antico!
      La lingua inerte nella bocca spiega,
      drizza i miei passi, portami con tè!
      Lascia la morte sol con la mia alma,
      per aver suo riflesso in quel ch’io dico.

      E per la terra nuovamente andrò,
      — forma effìmera già disincantata —
      ricordando l’amaro che conobbi,
      nuova provando la pena passata,
      insegnando a sentir l’amor che muore,
      e amar tutte le maschere del nulla.

      A stare, al tempo stesso, e lungi e presso,
      a esser multiplo, unanime e indiviso,
      poiché rimasi sveglio in piena morte,
      e so quello ch’esiste e quel che è d’uopo.
      Alzami dalla cenere in cui giaccio,
      che io ti spieghi l’Inferno e il Paradiso.

      La lingua inerte nella bocca spiega,
      che i morti sanno ancor più dei Profeti.
      Fammi di nuovo andar, libero e sgombro,
      tra le forme, incomplete, di voi vivi.
      Dimmi solo se c’è chi udir mi possa!
      Se no, lasciami nelle quiete ceneri.

*

X. ARCO

As faces estão irreconhecíveis:
e deviam ser belas.

A lembrança das vitórias atenuou-se:
— e, no entanto, eram célebres.

Do imperador que passou, não há vestígios:
— e foi tão poderoso.

Mas o vento que dançava nas pregas do vestido
— e um vento leve! —
continua a dançar ali.

Vede!
E era o vento.
O vento sonhado, apenas.
Ali está preso o vento que sempre foge.

A pedra, que não se move, ondula.
Dança. Para sempre.

E a mão do artista, há muitos séculos,
é também vento.

      X. ARCO

      I volti sono irriconoscibili;
      e dovevano essere belli.

      Il ricordo delle vittorie si è affievolito:
      — eppure, furono celebri.

      Dell’imperatore che passò, nessun vestigio:
      — e fu cosi poderoso.

      Ma il vento che danzava nelle pieghe della veste
      — ed era vento lieve! —
      continua lì a danzare.

      Vedete!
      Ed era il vento.
      D vento sognato, appena.
      Lì è prigioniero il vento che sempre fugge.

      La pietra, che non si muove, ondeggia.
      Danza. Per sempre.

      E la mano dell’artista, da molti secoli,
      è anche vento.

Traduzione di Edoardo Bizzarri
Tratto da Antonio Miranda

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