Vai passar

Essa fase difícil vai passar. Tudo passa, tudo sempre passa. Passa como os dias em que estamos isolados, solitários, vivendo em uma bolha de preservação individual e coletiva. Como as horas que vezes se arrastam e em outras vão embora depressa. Como o medo, o rancor, o riso e a dor.

Mas, e depois que passa, o que resta?

A gente se acostuma com as novas normalidades, o novo padrão, a mudança. Logo, a desordem se torna rotina e, portanto, mais organizada. Assim, o que era um período de angústias, luto, negação e incertezas acaba por se tornar o novo mundo. Porque tudo passa, mas arrasta consigo o que era antes, criando uma inédita realidade.

Ainda que este novo normal signifique permanecer em isolamento por muito mais tempo do que esperamos ou gostaríamos, ainda que tenhamos que nos preocupar com a Covid-19 e tomar precauções por anos, até que se desenvolva uma cura ou vacina, a pandemia e as mortes em massa vão passar. Não significa que a doença deixará de existir, apenas que o momento presente irá passar.

Isso é uma certeza.

O que me deixa acordada à noite e me preocupa mais que a ameaça invisível do vírus que nos aprisiona é tentar imaginar qual será a realidade do mundo depois que esse pesadelo acabar. A sociedade terá evoluído e repensado o consumismo, a ganância, a exploração e as desigualdades? Ou viveremos no mesmo sistema opressor, porém ainda mais desigual, injusto e desumano? Vamos, enfim, encarar o aquecimento global e a destruição da natureza como questões sérias e vitais, ou continuaremos a cultivar o negacionismo e a descrença na ciência?

Eu gostaria de ser otimista e pensar que, daqui a algum tempo, o ano de dois mil e vinte será conhecido como “o ponto de mutação” de nossa civilização, ano em que, enfim, evoluímos e tomamos consciência do que precisa ser feito para que todos vivam em harmonia, e essas coisas que soam como slogans hippies mas que, na verdade, são muito sérias. Quero ter fé e acreditar que, passada essa tormenta, veremos um céu de cores límpidas, sorrisos, fartura e oportunidades iguais. Veremos o nascer da utopia, a mudança que tanto gostaríamos de ver, pela qual tanto lutamos.

Porém, o pessimismo tem tomado conta de mim. Vejo que o egoísmo impera nas decisões de empresas, governos, pessoas que conheço. Testemunho lamentáveis situações, as quais não consigo combater, pois estou exausta e descrente na força do ser humano. Talvez o pessimismo seja uma maneira de me proteger, uma preparação inconsciente para o que está por vir; como se ao aceitar e tentar prever o pior cenário eu me tornasse imune a ele.

O pessimismo ronda a alma dos sonhadores. Eu luto contra ele, mas, em dias como hoje, a única certeza que me conforta a de que isso irá passar, seja como for, seja quando for.

Vai passar. Tudo passa. E, por hoje, é só isso que importa.


Foto: LOGAN WEAVER via Unsplash